A mais nova UC federal fica no litoral norte de São Paulo, abriga rica biodiversidade e tem potencial para turismo de mergulho
Brasíia (03/08/2016) – O presidente interino Michel Temer assinou na
noite de terça-feira (2/8) o decreto que cria o Refúgio de Vida
Silvestre (RVS) do Arquipélago de Alcatrazes, uma antiga reivindicação
dos ambientalistas. A mais nova unidade de conservação (UC) federal fica
no litoral norte de São Paulo, no município de São Sebastião. Com ela,
sobe para 326 o número de UCs geridas pelo Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio) no País.
O ministro do
Meio Ambiente, Sarney Filho, afirmou que a nova área protegida significa
um grande avanço, principalmente num bioma que é pouco lembrado, que é o
bioma marinho. “Trata-se de um passo importante, uma sinalização da
nova gestão, de que nós estamos inteiramente em consonância com as
preocupações globais a respeito do mar. A criação desta unidade marinha
será muito importante, não somente para a manutenção da biodiversidade,
mas também para atrair o turismo”, destacou o ministro.
O presidente do ICMBio,
Rômulo Mello, lembrou que a criação da unidade é resultado de todo um
processo de discussão que durou cerca de 30 anos entre governo,
ambientalistas e moradores da região. “Agora, com a publicação do
decreto, estamos dando início a outra etapa do processo que tem como
objetivo maior a conservação da natureza”, afirmou o presidente.
O secretário de
Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, José Pedro de
Oliveira, também citou o longo processo de luta pela proteção da
biodiversidade de Alcatrazes e destacou a decisão do governo. “O
Santuário preservará ambientes naturais únicos e de notável beleza
cênica nas águas brasileiras, além de proteger os animais que usam a
área para alimentação, reprodução e abrigo”, disse o secretário. Para
ele, “o decreto nos incentiva a levar adiante outras importantes áreas
protegidas, vitais para a sobrevivência da biodiversidade”.
Apoio dos militares
Logo que assumiu o
ministério, o ministro Sarney Filho reuniu-se com o ministro da Defesa,
Raul Jungman, para pedir o apoio dos militares à criação da nova unidade
de conservação. Jungman reforçou a posição do ministro e lembrou que os
dois ministérios já contavam com o apoio da Comissão Interministerial
dos Recursos do Mar (CCRM), coordenada pela Marinha.
O arquipélago, que serve
de baliza à navegação na costa brasileira desde o descobrimento do
Brasil, está situado em alto mar. Até dois anos atrás, a ilha principal
de Alcatrazes, que se eleva a quase 300 metros acima do nível do mar,
deixou de ser alvo de tiro de aferimento de canhões de navios da
Marinha. “Esse foi o primeiro entendimento entre os Ministérios da
Defesa e do Meio Ambiente, agora consolidado com criação do Santuário”,
explicou José Pedro de Oliveira.
Proteção e turismo
A mais nova unidade de
conservação abriga rica biodiversidade e tem potencial para turismo de
mergulho. Com ela, sobe para 326 o número de UCs geridas pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) no País.
Com 67,3 mil hectares, o
Refúgio busca proteger os ambientes naturais únicos criados pela
associação de características geológicas, geomorfológicas e correntes
marinhas; preservar a diversidade biológica, incluindo as espécies
insulares, endêmicas, ameaçadas ou migratórias que utilizam a área para
alimentação, reprodução e abrigo; garantir os bens e serviços ambientais
prestados pelos ecossistemas marinhos; e conciliar os interesses de
conservação da natureza com os de soberania nacional, já que se trata de área estratégica para a Marinha Brasileira.
O local é área de
ocorrência de espécies ameaçadas e endêmicas (exclusivas), como
Elecatinus figaro (peixe), Scinax alcatraz (anfíbio) e Bothrops alcatraz
(réptil), constantes do Livro Vermelho de Espécies Ameaçadas de
Extinção do Ministério do Meio Ambiente, e invertebrados marinhos raros e
em risco de desaparecer. Além disso, tem forte potencial para o turismo
de mergulho, o que pode gerar emprego e renda para a comunidade a
região.
Consulta públicaA consulta pública, para a
criação da unidade foi realizada em 30 de março de 2011, na cidade de
São Sebastião. Inicialmente foi proposta a criação de um Parque Nacional
Marinho em virtude do interesse local na visitação e utilização do
arquipélago para atividades de mergulho, sendo proposta uma área de
cerca de 21 mil hectares.
Em 2014 novas tratativas foram
realizadas junto à Marinha do Brasil, que culminaram com a alteração da
categoria da proposta para de Refúgio de Vida Silvestre e a ampliação da
área para cerca de 67 mil hectares, aumentando em três vezes a área
protegida.
Mobilização começou em 1990
A criação da UC remonta à década de 1990 quando a sociedade solicitou a
suspensão de exercícios de tiro pela Marinha e com os estudos
desenvolvidos pela ONG Sociedade de Defesa do Litoral Brasileiro através
do “Projeto Alcatrazes”.
A proposta inicial para proteger a
região era que fosse criado um parque nacional, após alguns estudos,
houve a decisão de mudança de categoria para refúgio de vida silvestre.
Segundo o coordenador de Criação de Unidade de Conservação do ICMBio
(COCUC), Aldízio de Oliveira Filho, essa alteração foi feita com base no
objetivo do Revis, que é proteger os ambientes naturais onde se
asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies ou
comunidades da fauna e flora local residente ou migratória.
Para Aldízio, no caso do Arquipélago de Alcatrazes “o refúgio de vida
silvestre é a categoria ideal em virtude da grande quantidade de
espécies insulares ( característica das ilhas) endêmicas e migratórias
que utilizam as ilhas para abrigo e reprodução”. Segundo ele, a proposta
de parque nacional tinha por base o incremento da visitação tanto nas
áreas das ilhas, como nas áreas de mergulho, no seu entorno. Porém, como
essas áreas estão sujeitas às fragilidades e as áreas de mergulho eram
anteriormente local de exercícios militares com munições, não seria
possível a sua abertura de imediato, o que tornou a categoria parque
nacional menos adequada.
Em decorrência do bom estado de conservação dos ambientes terrestres e
marinhos, a fauna local é rica e abundante. Apresenta elevados índices
de diversidade e endemismos, com destaque aos répteis e anfíbios.
A
porção insular tem sido amplamente estudada, funcionando como o
laboratório natural mais completo de toda região Sudeste/Sul do Brasil.
As primeiras pesquisas desenvolvidas no arquipélago datam de 1911, com
um levantamento completo do meio biótico realizado em 1920 pelo Museu de
Zoologia da Universidade de São Paulo e retomado em 1948, pelo
Instituto Butantã, atestando a elevada diversidade de seus recursos
genéticos.
Estudos
Ambientalistas e pesquisadores do Projeto Alcatrazes desenvolveram
estudos entre 1989 e 2002, tendo feitas várias expedições científicas
que reuniram várias instituições. Pesquisas sobre o meio natural mostram
que o arquipélago é o maior ninhal de aves marinhas das costas Sul e
Sudeste do Brasil, sendo reconhecida a importância do conjunto de ilhas
para a nidificação de várias espécies, entre elas o atobá-marrom (Sula
leucogaster), a fragata (Fregata magnificens),
trinta-réis-de-bico-vermelho (Sterna hirundinacea) e trinta-réis-real
(Sterna maxima).
As ilhas abrigam ainda várias espécies de
plantas e animais, atestando a sua riqueza biológica. A fauna terrestre é
marcada pelo elevado nível de endemismo, entre as quais se destacam a
jararaca-de-alcatrazes (Bothrops alcatraz) e a perereca-de-alcatrazes
(Scinax alcatraz). Vários destes animais e plantas também se encontram
ameaçados de extinção, constando em listas oficiais do Estado de São
Paulo e do Ministério do Meio Ambiente.
As formações florestais são classificadas como Mata Atlântica e
guardam “parentesco” com as formações continentais, sendo compostas,
predominantemente, por palmeiras. Quanto à cobertura vegetal da ilha de
Alcatrazes, estimou-se que entre 20 e 25% de sua área seja recoberta por
formações vegetais florestadas. O restante da área é basicamente
composto por vegetação de porte reduzido, com predominância de plantas
herbáceas e subarbustivas, além de rochas, muitas vezes recobertas por
bromélias, cactos, musgos e líquens.
Fauna marinhaA fauna marinha abriga
cerca de 150 espécies de peixes que vivem em associação aos substratos
rochosos ou de hábitos estritamente pelágicos. Entre as espécies da
ictiofauna, destaca-se o registro confirmado de nove espécies ameaçadas
de extinção, tais como o neon Elacatinus figaro. Os substratos rochosos
são compostos basicamente por algas calcárias crostosas, com extensas
áreas dominadas por Corallinaceae associadas à espécies de
ouriço-do-mar.
Além disso, essa fauna é também representada por duas espécies de
tartarugas-marinhas, que utilizam o local como áreas de alimentação e
refúgio, ocorrendo em altas densidades. Oito espécies de mamíferos
marinhos também são registradas para o local, entre baleias e golfinhos.
A baleia-de-Bryde (Balaenoptera edeni) é espécie mais frequentemente
avistada, sendo que a ilha dos Alcatrazes é considerada o ponto do
litoral brasileiro de maior importância para esta espécie.
Já estudo socioeconômico mostrou que o refúgio tem grande potencial para
atrair mergulhadores amadores e operadoras de mergulho, em função de
suas águas cristalinas, costões e rica biodiversidade marinha, podendo
tornar-se, no futuro, um ponto importante de turismo na área marinha do
litoral paulista.
Estudos fundiários indicam que a área marinha
está totalmente sob domínio da União. Uma porção do arquipélago vinha
sendo utilizada pela Marinha do Brasil para a prática de exercícios de
apoio de fogo naval desde as últimas décadas. Mas, com a reconsideração
da Marinha sobre a mudança do local para a prática de exercícios, a
proposta de tornar o arquipélago unidade de conservação da natureza
tomou o contorno atual.
Fonte: Comunicação ICMBio - (61) 2028-9280 - com Ascom do MMA - (61) 2028-1227 - e fotos de Cristian Dimitrius, publicada em Terça, 02 de Agosto de 2016, 16h36