Ensinar regras de citação e técnicas textuais como a paráfrase pode ser uma estratégia eficaz para combater o plágio
A cópia não é só um problema de pesquisa e produção textual, mas também éticoSe por um lado a democratização da internet ampliou e diversificou o acesso às fontes de pesquisa, por outro, facilitou uma má conduta comum entre estudantes de Ensino Médio e Superior: o plágio.
O comando é simples e tentador. Um ctrl + c seguido de ctrl + v e aquela tela, antes em branco, enche-se de frases, parágrafos ou, até mesmo, páginas inteiras de trabalhos alheios.
Marcada pela violação dos direitos autorais e comumente associada ao campo das artes como a música e a literatura, a infração também problematiza o ambiente escolar ao mostrar-se presente em trabalhos, lições e outras atividades do cotidiano do aluno.
Ao “roubar” as palavras de outro e, consequentemente, suas ideias, o delito coloca-se não somente como um problema de domínio da produção textual e de pesquisa, mas também de cunho ético.
Identificá-lo, porém, não é tão fácil.
Isso porque entre a cópia explícita e a escrita original há muitas nuances, explica Debora Diniz, autora, ao lado de Ana Terra, do livro Plágio: Palavras escondidas (LetrasLivres, 2014). “O plágio-cópia é aquele que primeiro vem à mente quando pensamos em plágio: é uma reprodução exata das palavras de outro texto sem citação de fonte”, explica.
Mas há também formas mais “sofisticadas” de se cometer e dissimular a infração, o chamado plágio-pastiche. “A cópia é feita com pequenas alterações, como, por exemplo, a substituição de algumas palavras por seus sinônimos, ou a mudança de verbos por substantivos e alterações da ordem de ideias”, explica a pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis).
É importante lembrar que não é plágio a citação referenciada a autores ou à paráfrase, por exemplo. “Muito pelo contrário, refletir a partir de outros autores é a premissa básica da ciência, pois avançamos a partir dos que já pensaram anteriormente sobre os problemas que estudamos”, explica Rossana Gaia, professora do Instituto Federal de Alagoas (Ifal).
Mas, para que isso ocorra, é necessário que os professores orientem seus alunos em relação às regras de uma escrita criativa, com a devida citação de fontes de informação e pesquisa.
“Defendo que esse conhecimento seja difundido com alunos desde o Ensino Fundamental, pois naturalizou-se encontrarmos alunos no Curso Superior utilizando a estratégia copiar e colar como sinônimo de pesquisa”, conta.
Nesse sentido, desenvolver atividades que exijam a exposição de pensamento próprio, e não apenas compilação de ideias de outros, pode ser uma forma de estimular os estudantes a criar, afastando assim a possibilidade de plágio.
“Nessa fase da vida, estamos aprendendo a ler, a escrever e a interpretar textos. Muitos dos plágios decorrem mais da desinformação sobre as regras de escrita do que de uma infração deliberada. O ideal é debater o tema em sala e, caso ainda ocorram episódios, repensar se as tarefas propostas não estão desestimulando os estudantes a formularem textos mais autorais”, sugere Ana Terra.
Marta Melo, mestre em Linguística e especialista em produção textual, acrescenta que a linguagem é dialógica e, nesse sentido, entende-se que a produção de todo e qualquer texto na escola nasce de outros textos, de várias leituras ou pesquisas bibliográficas.
“Em razão disso, o aluno tem por obrigação identificar as referidas fontes, sejam orais ou escritas, para dar credibilidade ao seu texto”, coloca.
É importante lembrar que, apesar de favorecida pelo ambiente virtual, a cópia no âmbito escolar não é nova. “Isso ocorre desde a época em que usávamos apenas livros e enciclopédias, portanto não é um fenômeno meramente virtual, mas vincula-se a um modo de perceber e respeitar a escrita do outro que me antecede no campo de pesquisa”, lembra Rossana.
Porém, em um mundo transformado pelas novas tecnologias de comunicação e informação, a questão da apropriação indevida de autoria merece uma análise mais profunda.
“É possível que esse seja um mecanismo que se retroalimenta: se temos mais informação disponível, mais facilmente podemos plagiar. Por outro lado, seremos mais rapidamente flagrados, seja pela simples investigação de similaridades textuais em sites de busca, seja pelo uso de softwares caça-plágio”, analisa Debora.
Para Marcelo Krokoscz, diretor do Colégio Fecap e membro da Rede Internacional de Combate ao Plágio Acadêmico, é necessário repensar os conceitos de autoria e plágio na atualidade. “Ambas as ideias são provenientes da modernidade, mas acabaram ficando defasadas em razão das mudanças sociais, tecnológicas e acadêmicas.
Por exemplo, a discussão sobre o conhecimento como um bem comum precisa ser desenvolvida e amplificada urgentemente sob o risco de ficarmos limitados ao tratamento de um problema pós-moderno com práticas e ações inquisitórias pré-modernas”, explica.
Segundo Krokoscz, a orientação dos professores aos alunos tem caráter preventivo importante. “Mas além disso, a dificuldade que os alunos têm em escrever contribui para a ocorrência do plágio o que nem sempre é um ato de má-fé e muitas vezes ocorre por ‘falha técnica’, ou seja, incompetência para a escrita.”
Em relação aos professores, posicionar-se claramente contra a prática da fraude autoral é a primeira coisa a ser feita, além de ensinar como é que se escreve, como devem ser reconhecidas as fontes e porque isso precisa ser feito.
A escola não pode simplesmente punir os alunos se não cria mecanismos e institui práticas de orientação e prevenção, diz.
“Da mesma forma, se a sociedade é corrupta e banaliza a prática da violação de direitos, fica mais difícil cobrar no particular o que é uma falha coletiva. Portanto, a eficácia das ações de combate ao plágio tem a ver com o cultivo de um ambiente virtuoso que envolve a todos, mais do que o controle e a punição individual.”
Fonte: Carta Educação
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