Pesquisadores e ONG procuram respostas para o surgimento e soluções para amenizar os efeitos da lama, que já ocupa 7km da Praia do Cassino.
Nos 7km afetados pela lama toda a morfodinâmica e biodiversidade foi alterada. Foto: Fábio Dutra/JA
Enquanto alguns defendem
que a lama é resultante de processos morfodinâmicos de ambientes
costeiros, outros veem o grande acúmulo de material como resultado de
ações antrópicas, pois apesar da lama poder, sim, ser consequência de
fenômenos naturais, a atual quantidade demonstra que há fatores ligados a
ação do homem em sua incidência, como as dragagens do Porto.
Um grupo que defende
esta ideia é formado pelo geógrafo Leandro Clavico – representando a
Câmara Municipal -, pela bióloga Alice Ott Fonseca e pelo presidente da
ONG Amigos da Natureza, Cleber Spy. Os três estiveram na redação do
Jornal Agora para explicar a urgência de se achar respostas sobre a
incidência da lama na praia do Cassino.
Segundo Leandro Clavico,
em cerca de 40 dias deve ocorrer uma Audiência Pública na Câmara
Municipal para discutir as medidas que devem ser tomadas perante o
problema. “Devemos debater as medidas necessárias para estudar o
impacto da lama no local. Discutir meios de amenizar os impactos, para
que as próximas dragagens não causem o que vem causando”, explica.
Os três pesquisadores
concordam que a dragagem é necessária, porém creem que os responsáveis
pela dragagem devem escolher formas ecossustentáveis e ecologicamente
responsáveis para gerir o descarte dos sedimentos.
De acordo com a bióloga
Alice Ott Fonseca, o material sedimentar oriundo da dragagem é rico em
nutrientes e poderia, sim, ser reutilizado de diversas formas e não
simplesmente despejado no mar.
Próxima dragagem
A próxima dragagem do
Porto deve acontecer no próximo mês – a última foi realizada nos meses
de dezembro de 2013 e janeiro de 2014 – e o ambiente praial ainda não se
recuperou dos efeitos da última interação. Desta forma, os
pesquisadores temem pelas consequências da próxima dragagem já que, na
última, foram lançados cerca de 3 milhões de metros cúbicos de
sedimentos no mar e após, cerca de 3 meses, a lama começou a aparecer na
praia.
Conforme a legislação,
os materiais devem ser despejados a 10 milhas da costa – distância que é
monitorada pelo transponder na draga – porém, segundo alguns relatos,
após sair da Barra, a draga já começa a despejar os resíduos,
soltando-os por todo o caminho, até alcançar a distância ideal. Talvez,
desta forma, acelerando o retorno dos sedimentos para a Praia.
Os pesquisadores
acreditam que a incidência da lama é uma soma de fatores, podendo ser
ocasionado por fatores naturais, mas também parece existir uma
correlação muito forte entre o sistema de dragagem ocorrendo de maneira
errada com o aparecimento da lama.
Segundo Leandro “é
importante ressaltar que se você largar 2 milhões de sedimentos de
forma antrópica [ação antrópica é a ação do homem sobre o habitat e as
modificações dela resultantes] no mar, o sistema não comporta, esse
sedimento fica ali na forma de um bolsão e na primeira tempestade por
conta dos fatores vento e correntes, esse sedimento acaba sendo levado
para a Praia”.
A bióloga Alice alerta
que uma das provas de que os sedimentos retornam à praia é a incidência
de grãos de soja no ambiente praial e alguns arbustos – que antes não
eram vistos – que foram notados na beira da praia. “Encontramos soja na
praia e também árvores que não são espécies naturais daqui, isso é
devido ao retorno desses sedimentos oriundos da dragagem”.
A situação precisa ser revertida
Nos últimos verões,
foram muitos os veículos atolados na lama e os veranistas puderam
perceber que a praia do Cassino não estava como de costume. Atualmente
são 7km de praia em extensão, atingida pela lama, e nestes 7km toda a
morfodinâmica natural e biodiversidade foi alterada, lá não existem mais
grande diversidade de espécies, tampouco ondas são observadas após a
incidência de lama nos locais.
Mas, segundo os três
pesquisadores, se a próxima dragagem ocorrer de forma sustentável o
ambiente praial tem chances de se recuperar – após algum tempo – e
talvez voltar a apresentar as características anteriores. Porém se nada
mudar, a incidência da lama só aumentará, a praia irá continuar se
transformando e a cada dragagem serão afetados mais e mais quilômetros.
Interesse econômico
Segundo o presidente da
Amigos da Natureza, Cleber Spy, os terminais que atuam no Porto não têm
interesse em preservar a praia, apenas visam aos seus interesses
econômicos. “Os terminais não são daqui, eles não têm interesse em
preservar a nossa praia e nem a ajudar a recuperação. Isso tem que
mudar, se a dragagem seguir nessa metodologia, não vamos resolver o
problema”, comenta.
Sobre alternativas do
que fazer com os sedimentos oriundos da dragagem, Cleber diz ser que é
possível gerar renda com o material, que pode ser utilizado na
fabricação de tijolos, pavimentação de ruas e também pode ser utilizado
como aterro.
Cleber, que é morador do
Cassino, conta ainda que duas semanas após as dragagens acontecerem, o
cheiro na praia fica insuportável devido à morte – por sufocamento – de
micro-organismos ocasionados pelo depósito de lama, “muitas pessoas
acham que o cheiro é da própria lama, mas o cheiro é da decomposição dos
micro-organismos”, conclui.
Fonte : Esther Louro, Jornal Agora, em 05/05/2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário