Hidrofones revelam a paisagem sonora do fundo do mar
MARCOS DE OLIVEIRA | 
  ED. 242 | ABRIL 2016 
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O equipamento é composto por um hidrofone, uma espécie de microfone 
especial para captar ondas sonoras embaixo d’água, além de um conjunto 
eletrônico de gravação e baterias. “O teste na Laje de Santos foi um dos
 primeiros experimentos que realizamos com o aparelho”, diz Padovese. 
Tudo começou quando o pesquisador pensava em estudar o processamento de 
sinais acústicos marinhos, uma área ainda incipiente no Brasil. “O 
problema é que não existe fábrica de hidrofones e de equipamentos para 
hidroacústica no país e, no exterior, os aparelhos custam entre US$ 5 
mil e US$ 30 mil, dependendo da configuração e uso.” Outro empecilho é 
que os hidrofones mais sofisticados, por terem uso militar em navios e 
submarinos, sofrem restrição comercial, precisando da autorização de 
venda dos governos onde estão as fábricas.
Padovese decidiu então desenvolver tecnologia própria nessa área. 
“Projetamos um gravador eletrônico, de baixíssimo consumo de energia, 
que registra os sons em cartões SD, iguais aos de câmeras fotográficas, 
que é instalado com pilhas alcalinas em um recipiente cilíndrico 
vedado”, explica. “Fizemos alguns exemplares que foram cedidos, em 
parceria, para grupos de pesquisa e estamos monitorando 
experimentalmente a Laje de Santos e Alcatrazes [arquipélago no litoral 
norte paulista integrante da Estação Ecológica Federal Tupinambás, onde 
também não é possível pescar e navegar nas proximidades].” Esses últimos
 possuem quatro cartões SD com capacidade para 128 gigabytes (GB) cada e
 pilhas para uma autonomia de até cinco meses de monitoramento contínuo.
 “O equipamento pode ser programado para realizar uma gravação contínua 
ou agendada”, diz. Com essa estratégia, é possível manter o equipamento 
embaixo d’água por até um ano. O aparelho foi testado em relação à 
vedação em até 300 metros de profundidade, mas a instalação e a retirada
 na Laje de Santos e em Alcatrazes foram realizadas por mergulhadores a 
20 metros.
Saber o horário de invasão do espaço marítimo do parque marinho 
facilita a abordagem das lanchas de fiscalização da Fundação Florestal, 
da Secretaria do Meio Ambiente estadual, gestora do Parque da Laje de 
Santos, ou da Polícia Militar Ambiental. “Também já pensamos em um 
sistema de monitoramento acústico submarino em tempo real, com a conexão
 do hidrofone a um equipamento de transmissão por rádio a partir da Laje
 até a sede da fundação em São Vicente [SP]”, diz Padovese.
Para o gestor do Parque da Laje de San-tos, José Edmilson Mello 
Júnior, o hidrofone mostrou-se importante para a fiscalização e proteção
 ambiental. “O local é uma unidade de conservação de proteção integral e
 se a fiscalização parar um barco, mesmo que esteja apenas passando com 
apetrechos de pesca, os ocupantes podem ter os equipamentos apreendidos e
 recebem multa”, explica Mello Júnior. Padovese conta que é possível 
registrar e estudar vários outros tipos de eventos acústicos, alguns a 
muitos quilômetros de distância – na água, o som viaja quase cinco vezes
 mais rápido e pode ser detectado a distâncias muito maiores do que no 
ar. Vocalizações de baleias e movimentos de cardumes de peixes podem ser
 identificados. Em geral, os dados são estudados na forma de gráficos, 
chamados de espectrogramas, que mostram como o conteúdo de frequências 
acústicas varia com o tempo.
Processamento de dados
 
 O volume de dados obtidos com um hidrofone é grande. Para processar as informações, o grupo da Poli desenvolveu um software que permite essa visualização tempo-frequência do som e possibilita o reconhecimento de padrões de sinais. Os pesquisadores conseguem, por exemplo, identificar diferentes espécies de peixes utilizando apenas esses sinais acústicos, assim como de baleias, que têm um registro bem característico das vocalizações. No caso particular de cardumes de peixes, associar os diferentes padrões acústicos com as espécies ainda depende de um estudo multidisciplinar, com pesquisadores das áreas de biologia, oceanografia ou ciências do mar.
Para Mello Júnior, a necessidade inicial é fazer um levantamento dos 
animais que frequentam a Laje, como as baleias e golfinhos. “Três ruídos
 podem atrapalhar a vida desses mamíferos na bacia de Santos: a 
prospecção de petróleo na região do pré-sal, o emissário submarino [que 
leva o esgoto tratado para o alto-mar] e a área relacionada ao fundeio 
de navios do Porto de Santo.” Padovese estabeleceu uma parceria e cedeu 
os hidrofones para um grupo que estuda baleias jubarte (Megaptera novaeangliae)
 no município de Uruçuca, próximo a Ilhéus (BA). “Acompanhamos 
visualmente entre julho e novembro as baleias a partir de um morro na 
serra Grande a 90 metros acima do mar. O registro acústico com o 
equipamento foi importante porque complementa o visual, principalmente 
nessa fase em que elas estão parindo e nadam com os filhotes”, diz Júlio
 Baumgarten, professor da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc), de
 Ilhéus. Duas vezes no ano foram instalados três aparelhos no fundo do 
mar capazes de fazer o registro acústico de uma área de cerca de 200 
quilômetros quadrados. “Com a gravação podemos acompanhar a atividade 
das baleias inclusive à noite”, diz.
O equipamento autônomo para uso no fundo do mar já está pronto, teve 
financiamento da FAPESP e é similar aos que existem no exterior. 
Padovese estima que o modelo construído por sua equipe custaria no 
mercado entre US$ 2 mil e US$ 4 mil. A tecnologia desenvolvida também 
está sendo utilizada e otimizada em parceria com o Instituto de 
Pesquisas da Marinha (IPqM), no Rio de Janeiro.
“Tem crescido muito a demanda por estudos de impacto de ruído 
acústico submarino na fauna marinha, gerados por empreendimentos, como 
ampliações de portos, rios e hidrelétricas”, diz Padovese. Além de 
continuar a agregar informações ao software de processamento de sinais, 
ele tem incentivado seus alunos a estruturar uma empresa. “A ideia é 
prestar serviços em acústica submarina nas áreas de infraestrutura e 
pesquisa científica. Mas também há perspectivas para uma associação com 
uma indústria de equipamentos eletrônicos, que demonstrou interesse na 
comercialização desses aparelhos. São planos que ainda estão sendo 
avaliados.”
Projetos
1. Observatório Acústico Submarino para Monitoramento de Parques Marinhos (n° 2012/04785-0); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Linilson Rodrigues Padovese (USP); Investimento R$ 238.194,70 e US$ 24.207,17.
2. Plataforma de sensoriamento acústico submarino para redes de monitoramento (n° 2012/23016-7); Modalidade Bolsa no País – Regular – Pós-doutorado; Bolsista Manuel Alfredo Caldas Morgan (USP); Pesquisador responsável Linilson Rodrigues Padovese (USP); Investimento R$ 166.859,21.
 FONTE: Revista Pesquisa FAPESP
 
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